segunda-feira, 30 de junho de 2014

O DESAFIO DE DISCERNIR O NOSSO TEMPO!



Precisamos fazer uma leitura adequada da nossa época para aplicarmos corretamente a teologia aprendida. A pós-modernidade é neta da renascença e a frustração do idealismo de seu pai, o  “iluminismo”. O último colocava a razão como centro da verdade e proclamava um mundo melhor a partir da razão humana. O gráfico abaixo exemplifica bem essa decadência cultural:
Idade Média
Pretensamente o tempo de Deus
Renascença
Homem no Centro
Iluminismo
Razão no Centro
Pós-modernidade
Sem centro
     
Sobre essa frustração que a pós-modernidade carrega em sua essência, provinda do Iluminismo, é comentada pelo Dr. Leandro Antônio de Lima:
Os modernistas tentavam encontrar algo que pudesse unificar o pensamento. Eles fizeram isso até mesmo tentando inventar novos mitos (com Horheimer e Adorno), como as obras de arte de Picasso, por exemplo, buscavam já numa atitude desesperada de quem percebe que o projeto estava  falhando...Desejava-se algo que devolvesse o absoluto, não no divino, mas no próprio homem, mas não foi possível encontrar. A pós-modernidade desistiu dessa busca e simplesmente aceitou que o absoluto não existe e, para muitos, nem os ideais, mergulhando no existencialismo niilista (do latim “nihil”, isto é “nada”, ou seja, a ideia de que não há sentido transcendente algum para a existência e, por isso, tudo o que resta é viver a vida o melhor possivepossívele preocupar com o depois). Por isso, a apalvra chave da pós-modernidade é anti-homem (embora não anti-humanismo). Curiosamente, este “anti-homem” da pós-modernidade é bem mais “humano” do que o humanismo da modernidade, pois se abre para a realidade, para a efemeridade. E por sua vez pode se abrir para um envolvimento mais sério com a natureza e um respeito até mesmo maior pela vida.[1]
Com respeito ao último ponto, a pós-modernidade, que caracteriza  o nosso tempo, Dr. Hermisten Maia esclarece:
Hoje, não temos mais referências, o homem já não é o centro de todas as coisas, pois já não há mais centro. Estamos “perdidos no espaço”. Sem absolutos, não sabemos ao certo o valor do homem e o seu papel no universo. Sem princípios universais, não existem absolutos; sem estes, tudo é possível.[2]
           
Podemos colocar algumas diferenças práticas entre o iluminismo e a pós-modernidade:
Iluminismo     
Pós-modernidade
Proposito
Diversão
Planejamento
Casualidade
Hierarquia
Anarquia
Centralização
Dispersão
Seleção
Associação
                                
O iluminismo era caracterizado por organização, planejamento, controle e domínio. Sua ruina se deu por causa do próprio homem, não tem como existir harmonia, verdade e justiça, baseado no homem. Já a pós-modernidade é essencialmente imediatista, subjetivista e existencialista em todas as suas esferas. Desprezam o controle, o domínio, o planejamento como alvo existencial, por não existir verdade absoluta, padrão, é melhor deixar as coisas como estão para ver o que vai dar.[3]
Essa relatividade é a marcar maior da pós-modernidade. Contudo, na prática ela é intolerante em relação  a uma visão ortodoxa, firme, convicta de algo. A incoerência é sua característica, afirma não existir verdade absoluta, todavia, afirma verdades absolutas: “Que não existe verdade absoluta!” Tudo o que se opõe a ideia de relativismos é classificado como uma ofensa a paz e harmonia cultural e social. A razão de tal atitude é simples, a pós-modernidade se baseia no subjetivismo, no sentimento e experiência. Logo, quando as bases de uma cultura se baseia em subjetivismo, tudo é relativizado a particularidade de cada indivíduo. Porém, ao mesmo tempo que, é relativizado, é também normatizado a partir do sentimento da maioria, da massa, para que todos vivam dentro de um padrão criado a partir de sentimentos e experiências comuns.
            O pluralismo é uma das mais fortes características da pós-modernidade. A pluralidade de raça, crença, sistemas de valores, línguas, cultura, religião, é absolutamente natural para a humanidade. Por exemplo os EUA, comenta Dr. Carson, é maior nação judaica irlandesa, sueca do mundo; é a segunda maior nação negra e logo se tornará a terceira maior nação hispânica.[4] É uma torre de babel! Quanto a questão de pluralidade americana, que representa a diversidade mundial, não é nada ruim em si mesmo e nem bom em si, mas natural para o contexto histórico americano. Por outro lado, existe uma pluralidade incentivada, onde a sociedade apoia e incentiva a pluralidade para uma convivência “melhor” sem muitos conflitos ideológicos. Nesse caso a pluralidade incentivada é um valor em si mesmo, a mudança é tornar-se essencial para o homem moderno. Por trás de toda essa luta por pluralidade e mudanças constantes, o foco principal é a religião. Por quê? Porque a discussão toda gira em torno da autoridade, de moralidade, da verdade, do bem, do mal, da revelação e assim por diante. [5]
            O Dr. Carson expõe com clareza a pluralidade mais perigosa para a saúde da igreja, que é a pluralidade filosófica ou hermenêutica. Esse pluralismo não aceita que alguma verdade, ideologia ou religião esteja acima de outra. O único credo absoluto é o credo do pluralismo. É um espirito de desconstrução cultural. Essa nova hermenêutica pluralista não usa recursos objetivos para interpretação, mas apenas instrumentos subjetivos, logo, toda a interpretação, tratando-se da Bíblia, é relativizada pelo subjetivismo. A hermenêutica conservadora pertence à era “moderna” em que a ciência, a erudição e o estudo sério eram o pensamento capaz de resolver a maioria dos problemas, de responder à maioria das perguntas e de entender toda a realidade. A hermenêutica radical, em contraposição, reconhece a subjetividade da interpretação e o quanto ela é modelada pelas culturas e subculturas a que o interprete pertence, esclarece Dr. Carson.[6]
            Resumindo, a pós-modernidade é a cultura da diversidade incentivada e imposta culturalmente. É escravizada pelo coração enganoso, pelo subjetivismo, ancorada em um porto que não é seguro, que é instável e mutável o tempo todo. É a desconstrução de tudo que é antigo, passado, e a construção disfarçada de um novo tempo sem eixo, sem rumo, aliás, o rumo e o eixo continua sendo o homem, mas não tendo como eixo o soberano Deus e sua Palavra! Somente uma razão e coração regenerados pelo Espírito Santo podem entender que a vida sem Deus é uma vida sem eixo, sem rumo, sem graça! O pior de tudo é que muitos vão descobrir que viver para essa vida é correr atrás do vento, somente no dia do juízo!

Reverendo Márcio Willian Chaveiro




[1] LIMA, Leandro Antônio de Lima, O Futuro do Calvinismo, Editora Cultura Cristã, 2010, pp.90-91
[2] MAIA, passim.  p. 200
[3] MCGRATH, 2005, passim. p.151
[4] CARSON, D. A. Carson, O Deus Amordaçado o Cristianismo Confronta o Pluralismo, Editora SHEDD, 2013, p. 13.
[5] CARSON, D. A. Carson, pp. 18-19
[6] Ibid, p. 19

A ESCRITURA PARA A TEOLOGIA REFORMADA




Para os teólogos reformados a Escritura é infalível, inerrante, autoritativa  e  única regra de fé e prática. Por 18 séculos na história da igreja prevaleceu a opinião ortodoxa da inspiração divina. Os pais da igreja sempre afirmaram isso, com raríssimas exceções de alguns hereges que se levantaram questionando alguns livros como inspirados. Para os liberais e neo-ortodoxos essa posição com relação a Escritura defendida pelos reformados é radical e xiita, contudo, a própria Escritura testemunha com relação a sua inspiração, crer nessa verdade é uma questão de fé, embora as evidencias de inspiração sejam muitas tanto internas como externas nas Escrituras. Na Escritura Deus revelou tudo o que lhe aprouve revelar para o bem dos seus filhos.
Segundo a Confissão de Fé de Westminster, capítulo 1, seção 10, estabelece o critério de avaliação da vida da igreja:
O Juiz Supremo, pelo qual todas as controvérsias religiosas têm de ser determinadas, e por quem serão examinados todos os decretos de concílios, todas as opiniões dos antigos escritores, todas as doutrinas de homens e opiniões particulares, o Juiz Supremo, em cuja sentença nos devemos firmar, não pode ser outro senão o Espírito Santo falando na Escritura.
    
Esse é o conceito que defendemos como o correto, conhecido como o conceito ortodoxo das Escrituras. É considerado conceito ortodoxo aquele que aceita plenamente a definição de que a Bíblia toda é inspirada por Deus, inerrante e infalível. Neste grupo podemos encontrar um grande número de representantes em diferentes denominações históricas. Em alguns casos são chamados de conservadores, fundamentalistas ou até mesmo de evangélicos somente (principalmente no contexto americano).[1]
            A Bíblia não é um compêndio de Teologia Sistemática. É a revelação que Deus apresenta do plano e da história da redenção e, como tal, é também o registro histórico do que Deus tem feito e dito para realizar esse plano. O grande teólogo holandês Kuyper afirmou:

A Teologia nunca é “arquetípica”[2], mas “éctipa”[3]. Ela não é gerada pelo esforço de nossa observação de Deus, mas o resultado da revelação soberana e pessoal de Deus. Uma “teologia arquetípica” – se é que podemos falar deste modo – pertence somente a Deus, porque só ele se conhece perfeitamente. Por isso, a Teologia sempre será o efeito da ação reveladora, inspiradora e iluminadora de Deus por intermédio do Espírito. A Teologia nunca é a causa primária; sempre é o efeito da ação de Deus revelar-se. “No princípio Deus” – isto deve ser sempre considerado em todo enfoque que dermos à realidade. Deus se revela e se interpreta por meio do Espírito; somente por meio dele poderemos ter genuíno conhecimento de Deus. A Teologia sempre é relativa: “Relativa à revelação de Deus. Esse precede e o homem acompanha.”[4]

            A Teologia sempre será serva da Escritura e não o contrário! A teologia deve ser desenvolvida a partir da revelação, se purificando, buscando fazer o que é correto, aplicar de forma adequada. A igreja deve ser edificada e levada a glorificar a Deus a partir da boa teologia. Teologia que não edifica a igreja e a leva a glorificar a Deus, não foi produzida pela revelação de Deus em sua Palavra!
            A convicção reformada sobre a Escritura é refletida nesta afirmação de Berkhof: “A Bíblia é e continuará a ser a palavra de Deus para todas as gerações sucessivas dos homens somente em virtude de que sua inspiração é divina. Toda a Escritura foi dada por inspiração de Deus. Isto a torna a regra infalível de fé e prática para a humanidade.[5]  E Loraine Boettner acrescenta:      

Nossas razões primárias por assegurar que a Bíblia é a palavra inspirada de Deus é que os escritores reivindicam esta inspiração, e que o conteúdo de sua mensagem está sustentado  nesta reivindicação. A uniformidade com que os profetas insistem que a mensagem que eles falam vem não deles próprios, mas do Senhor – que sua mensagem era a pura e genuína Voz de Deus, falada a eles exatamente como eles tinham a recebido - é um notável fenômeno da Escritura.[6]      

  Para os ortodoxos a Escritura é infalível e consequentemente inerrante:
A inerrância é o ponto de vista que, quando todos os fatos forem conhecidos, determinarão que a Bíblia, nos seus autógrafos originais e corretamente interpretada, é inteiramente verdadeira, nunca falsa, em tudo quanto afirma, quer no tocante à doutrina e ética quer no tocante às ciências sociais, físicas ou biológicas[7]     

O fato dos reformados crerem na suficiência das Escrituras, tendo-a como única regra de fé e prática, não significa que o conhecimento secular é desprezado ou que entendemos que a Bíblia fale sobre tudo. Significa que a Bíblia nos instrui a influenciar a cultura, a sociedade, para glorificar a Deus! Michael Horton esclarece:
Os reformadores insistiram que a Escritura não somente tem a última palavra, como é também o princípio formal de tudo o que cremos sobre a doutrina e conduta. Isto é, ela delineia e forma nossa fé. Não significa simplesmente desconsiderar essencialmente as definições seculares da realidade emprestadas da psicologia, do comércio, da sociologia, da política e dos setores correlatos. Antes, é mais provavelmente subverter nossas pressuposições. Nesse aspecto, os reformadores distinguiam entre “coisas celestiais” e “coisas terrenas”. No âmbito destas últimas, inclusive ciência, arte e filosofia, os descrentes podiam contribuir para o avanço do conhecimento e da experiência. Afinal, a Escritura não está interessada em dizer-nos todas as coisas sobre tudo, e o mundo de Deus está aberto à investigação de todos. Mas as realidades transcendentes do caráter de Deus, suas ordens e sua obra salvadora, não estão disponíveis ao filosofo, cientista, artista ou terapeuta. A sabedoria secular pode nos levar à verdade sobre a revolução dos planetas mas não pode explicar a natureza de Deus, o eu, a culpa e a redenção. Ela não pode nos levar à verdade acerca de como somos salvos da ira de Deus, pois recusa-se a crer que isso seja sequer uma realidade para início de conversa. “A palavra da cruz é loucura para os que se perdem”, disse o apostolo Paulo, porque ela não se amolda às perguntas – muito menos às respostas -  da sabedoria secular.[8]

Por ser a verdade de Deus para nós, reformados, a Bíblia deve ser pregada com toda a ousadia e poder do Espírito Santo. Todo pregador deve ter diante de seus olhos ao pregar, a glória de Deus:
Nossa adoração é fraca porque nossos conhecimentos de Deus são fracos, e nossos conhecimentos de Deus são fracos porque a nossa pregação é fraca. Quando, porém, a Palavra de Deus é exposta na sua plenitude e a congregação começa a ter um vislumbre da glória do Deus vivo, todos se curvam em reverente temor solene e admiração jubilosa diante do seu trono. É a pregação que realiza isso – a proclamação da Palavra de Deus no poder do Espírito de Deus. É por isso que a pregação é incomparável e insubstituível.[9]

Concluo essa parte com a declaração edificante de Strong sobre a infalibilidade das Escrituras:
...a Bíblia é infalível no sentido de que qualquer que se rende num espírito dócil aos seus ensinos não cairá no doloroso erro em matéria de fé e caridade. Melhor do que tudo, encontrará nela o segredo de uma nova, santa e abençoada vida ‘escondida com Cristo em Deus (Cl. 3.3). As Escrituras testemunham de Cristo…Através delas ele verdadeiramente e adequadamente se faz conhecido a nós.[10]   


Reverendo Márcio Willian Chaveiro




[1] MEISTER, Mauro Meister – Panorama da Teologia Bíblica, apostila não publicada – p. 04
[2] Arquétipo é algo original, modelo. A teologia modelo só Deus tem.
[3] Ectipica é o reflexo do arquétipo, do modelo, cópia do modelo. Os homens desenvolvem uma copia da teologia de Deus, muitas vezes completamente oposta a ela. Para ser uma cópia verdadeira depende da revelação, Escritura.
[4] Citado por HERMINSTEN MAIA, João Calvino 500 anos, Editora Cristã, 2009, p.81
[5] BERKHOF, Louis Berkhof, Manual de Doutrina Cristã, Ed. Ceibel, Patrocínio - MG, 1992, pp. 40-41. 
[6] Loraine Boettner, Studies in Theology, The Presbiterian And Reformed Publishing Company, Phillipsburg, New Jersey, 1985. p.15.
[7] ELWELL, Walter A.Elwell, Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, vol.II Ed. Vida Nova, São Paulo-SP, 1988, p. 180.
[8] HORTON, Michael Horton & Joel Beeke,… Sola Scriptura, Editora Cultura Cristã, 2000,  pp.13-14
[9]  STOTT, John Stott, Eu Creio na Pregação, São Paulo: Editora Vida, 2003, p. 89
[10] STRONG, Augustus Hopkins Strong, Teologia Sistemática, Vol. I, Ed. Teológica Ltda, São Paulo –SP, 2002, p. 301.

quarta-feira, 25 de junho de 2014

CAIO FABIO NO PROGRAMA THE NOITE



            
            Na noite do dia 23/06/2014 o apresentador Danilo Gentili em seu programa The Noite do SBT recebeu Caio Fabio como convidado para falar sobre suas declarações polêmicas para o meio evangélico. Foi uma entrevista interessante e polêmica como deveria ser. Sem dúvida, muitos assistiram tanto evangélicos como não evangélicos. Particularmente, não assisti no dia que passou na tv mas vi pelo youtube.[1]
Quero nesse primeiro momento afirmar que fui positivamente influenciado por Caio até a década de 90, onde o mesmo procurava pregar fielmente as Escrituras, buscava instruir o povo evangélico, como ele mesmo declarou no citado programa. Eu ainda na época não era pastor, fui para o Seminário no ano de 1999, logo, após a queda moral do referido pastor. Chorei muito com sua queda, o defendi muitas vezes de acusações infundadas, de alguns com os quais convivi. Ainda hoje considero muitos dos seus ensinos de 90 para trás como relevantes para o nosso tempo. Entendo que ele foi um grande comunicador do Evangelho, honesto com relação a dinheiro em seu ministério, e que sinceramente procurou o bem da igreja. Contudo, ao cair moralmente, perdeu-se teologicamente e eticamente. Não digo que se perdeu por ter caído em adultério, pois isto é algo que todos estamos sujeitos, o importante é que ele se arrependeu e Deus o perdoou, mas por ter demonstrado a partir de então total incredulidade com relação a saúde espiritual da igreja no Brasil. A igreja está doente, acredito nisso, mas ainda existem 7 mil que não se dobraram a Baal. O Caio parece sofrer de uma síndrome de Elias, ao achar que somente ele é fiel em todo o Israel de Deus (1 Rs 19. 9-14) ! Lamento muito que ele tenha essa visão tão distorcida de si mesmo, e de todos os outros! Com qual fundamento digo isso a respeito dele, com base nas próprias afirmações constantes que faz, demonstrando arrogância e orgulho. Para ele todo aquele que pensa teologicamente contrário é imbecillizado, idiota, descerebrado! A história teológica do cristianismo foi composta por teólogos tolos, de mentes pequenas, que não entendiam o que tão claramente ele entende, assim Caio fala se expressa em várias de seus vídeos postados na internet![2]
Gostaria de fazer pequenas considerações sobre algumas afirmações do Caio na entrevista com o Gentili. Inicialmente, Caio falou corretamente sobre as influências negativas dos líderes da Teologia da Prosperidade, embora em sua fala não deixou claro que falava deles, o que poderia e deve ter causado variadas interpretações por parte dos telespectadores ímpios, que não conhecem a realidade evangélica, levando-os a entender que todo evangélico é: sem instrução, é descerebrado, expectador de circo, marionetado por líderes corruptos, dependentes dos gurus tiranos, e outros adjetivos. Existem crentes que pensam, pastores que ensinam suas ovelhas a pensarem, a criticarem, a avaliarem tudo que ouvem a luz da Palavra. Existem pastores que sofrem pelo Evangelho, que amam a Cristo e sua Palavra, que buscam todo o tempo serem achados fiéis! Muitos pastores vocacionados por Deus têm lutado contra a teologia da prosperidade em suas igrejas, contra a manipulação da fé, contra a distorção da Palavra de Deus!
O Caio Fabio faz uma total descontinuidade entre o Antigo Testamento e Novo Testamento, que leva o leigo em teologia, como o Gentili a entender que nada do Antigo serve para a prática atual. O Caio se esquece que a lei moral, a aliança, permanecem em todos os tempos. As leis cerimoniais, civis deixam ter continuidade no Novo Testamento porque eram sombra do que haveria de vir (Cl 2. 16-17). Todavia, a lei moral e a aliança feita por Deus com o homem desde o Éden tem sido mantida e cumprida por meio do Mediador, que é Cristo. Caio presta um desfavor aos crentes menos instruídos sobre a valorização devida ao Antigo Testamento, como Palavra de Deus, e faz o mesmo, com menor intensidade com o Novo Testamento.
Outro ponto que destaco dessa entrevista é que o Caio afirma que anjos tiveram uma relação sexual com mulheres em Gênesis 6. 1-5. Não precisa de muito esforço intelectual para entender essa impossibilidade. Primeiro, anjos são seres incorpóreos, são narradas várias manifestações desses seres espirituais na Bíblia de muitas maneiras e formas, não tendo corpos próprios como os homens, mas as vezes se apresentando como homens. Se eles não têm corpo próprio, teriam “espermas angelicais” para reproduzirem?  Se ainda possuíssem o corpo de homens, como os demônios fizeram com os gadarenos (Mt 8. 28-34), seria esperma do possuído e não do possuidor! Segundo, é natural exegeticamente dentro do contexto e em toda a Escritura, entender que o capítulo 4. 17-24 de Gênesis fala dos filhos de Caim, e o capítulo 5 registra a genealogia dos filhos de Deus que são os descendentes de Sete, e portanto, o capítulo 6 está tratando de casamentos mistos, entre os filhos de Deus (descendentes de Sete) com as descendentes de Caim (filhas dos homens). É um absurdo exegético as declarações do Caio Fabio sobre ter sido formado gigantes a partir de uma relação hibrida (cruzamento de espécies diferentes) de anjos com mulheres! Ele se apoia mais na lenda judaica, do que na exegese bíblica natural do texto.
                   O Caio Fabio tem se caracterizado por suas palavras obscenas e improprias. Gostaria que interpretasse o que Paulo afirma aos irmãos em Éfeso ao dizer (Ef 5. 3-4): “Mas a impudicícia e toda sorte de impurezas ou cobiça nem sequer se nomeiem entre vós, como convém a santos; nem conversas torpe, nem palavras vãs ou chocarrices, cousas essas inconvenientes, antes pelo contrário, ações de graças.”  A expressão “palavras vãs” são conversas que geram imoralidade na mente do outro e “chocarrices tem a ver com humorismo excessivo, um humor movido a imoralidade. E Paulo ainda afirma que são  “cousas inconvenientes” que  traz a ideia de “imbecilidade”, conversas sem sentido, vãs. Foi isso que Caio usou por muitas vezes no programa, por exemplo ao se referir a impossibilidade de uma relação sexual entre um gigante nefilim tem 11 metros, como o Gentili defendia, com uma mulher com 1,70!
            Por último o que destaco (o que poderia fazer em relação a outros pontos negativos) é o episódio sexual de sua infância. Ele conta suas aventuras sexuais desde os cinco anos de idade com a babá com uma naturalidade extraordinária! Somente no final do programa em uma pequena fala, esclarece que todas essas aventuras e distorções sexuais que iniciaram na infância (que foi  um ato de pedofilia por parte da baba) fizeram parte da sua vida anterior a conversão. O que naturalmente para pessoas não convertidas gerou dúvidas, e um desfavor a visão delas com relação ao evangelho! Em nenhum momento Caio condena a atitude da baba, a elogia sexualmente, e afirma que contribuiu para sua vida sexual! Como uma experiência dessa pode contribuir para uma vida sexual? Ele foi vítima de uma perversão sexual, alguém que deveria cuidar e o proteger, fez totalmente o contrário!
            Concluo dizendo que admirava o Caio de 90 para trás, não o Caio atual! Ele tem produzido em seus seguidores a mesma característica daqueles que ele tanto condena, os seguidores dos pastores da Teologia da Prosperidade. Porque tanto estes como aqueles não questionam os ensinamentos dos seus mestres. O Caio não é desonesto como os teólogos da prosperidade, nem mal caráter, contudo, age muito voltado para si, colocando-se sempre como o dono da verdade, o inquestionável, o imbatível teologicamente, que usa como artificio zombar de todos que pensam de forma contrária, trazendo para si hostilidade desnecessária de gente sincera, de gente piedosa. Nem todos que não admiram o Caio são ligados a teólogos neopentecostais, ou pentecostais, ou a teologia da prosperidade. Esses que tem se indignado não são todos religiosos, presos a instituições, existem muitos crentes maduros, centrados, equilibrados e pensantes que não concordam com ele, e tem se entristecido por causa da sua arrogância disfarçada de apologia ao Evangelho!
Em Cristo
Reverendo Márcio Willian





[1] http://youtu.be/cbhUEhvm7W0
[2] http://youtu.be/kWs8sW0hHdA





sexta-feira, 20 de junho de 2014

RESENHA DO LIVRO: ECLIPSE DA ALMA


 Eclipse da Alma - Vários (8563607022)



MÁSPOLI, Antônio A. G. (Org.) – Eclipse da Alma: edição século 21. São Paulo: Fonte Editorial 2010.

Introdução
O livro Eclipse da Alma organizado pelo Dr. Antônio Máspoli é um excelente livro para aqueles que se interessam por conhecer mais sobre as doenças psicossomáticas. É um livro que é produto de uma competente equipe de especialistas nas doenças da mente, tais como: Dr. Pérsio Ribeiro de Deus – Drª. Patrícia Pazinato – Drª. Dâmaris Cristina de Araújo Malta.
Progressivamente a quantidade de pessoas com doenças psicossomáticas aumenta, tornando uma tarefa árdua para os pastores que precisam de livros como este para auxiliar na interpretação dessas doenças e saber para quem deve ser encaminhados alguns casos.
Passaremos para os pontos principais do livro, apontando apenas as que nos chamou mais atenção e faremos considerações criticas a respeito do mesmo, na intenção de tornar mais interessante a avaliação e consideração sobre o mesmo.
1.  A Psiquiatria e a Religião
Esse assunto é tratado com bastante propriedade pelo Dr. Pérsio Ribeiro de Deus, onde ele apresenta as interpretações provindas da religião com relação as doenças da mente. Embora ele demonstre os conceitos errados da religião, considera esse meio como campo  terapêutico para aquele que se encontra doente na sua psiquê.
            Concordamos com o Dr. Pérsio que a religião primitiva e ainda alguns círculos atuais interpretam depressão como sendo puramente influência demoníaca. Contudo, no desenvolvimento do raciocínio do singular escritor, demonstra uma falta de compreensão bíblica teológica com relação alguns efeitos da Queda na mente humana e a possibilidade de alguns casos serem realmente causados por pecado ou até mesmo possessão demoníaca. No caso citado por ele, que é Davi, a causa da depressão era sem duvida algum pecado não confessado, como o próprio declara no Salmo 32.4: “Porque a tua mão pesava dia e noite sobre mim, e o meu vigor se tornou em sequidão de estio.”
            Para comprovar a nossa observação, o Dr. Pérsio mais adiante referindo-se ao rei Saul, faz a seguinte análise:
“Sob a leitura da psiquiatria atual, Saul se enquadra perfeitamente num distúrbio psíquico denominado Transtorno Afetivo Bipolar. Nesta doença, há uma alternativa entre períodos de euforia e de grande coragem e períodos de profunda  depressão, inclusive com a presença de delírios de perseguição. Seus criados, entretanto, interpretaram sua alteração psíquica como um espírito mau da parte do Senhor. Por tudo que foi exposto até o momento, a interpretação dos criados era perfeitamente compreensível à época, pois acreditava-se então que Iavé os punia com catástrofes, doenças e sofrimentos, para que retornassem ao caminho do Senhor.”[1]
            Fica claro que o Dr. Pérsio é um excelente psiquiatra, compreende todo o mecanismo psíquico de uma pessoa, no ponto de vista médico. Contudo, ao usar o conhecimento médico para interpretar comportamentos de homens narrados nas Escrituras, comete alguns deslizes teológicos. Quando diz que “Sob a psiquiatria atual, Saul...” Demonstra que toda a sua análise de Saul parte da psiquiatria e não de uma compreensão exegética do texto. Depois afirma na referida citação: “...Seus criados, entretanto, interpretaram sua alteração psíquica como um espírito mau da parte do Senhor...” Indica que seus pressupostos teológicos consciente e inconscientemente defende que os relatos bíblicos são frutos de uma religião, e não a religião judaica fruto das Escrituras. Toda narrativa deve ser interpretada a luz de outras passagens. Sendo assim, Saul foi um homem com neuroses de perseguição, nesse ponto a avaliação esta correta, mas em determinados momentos foi oprimido por espíritos malignos que potencializaram esses pecados e distorções em sua alma.
            É importante esclarecermos que essa avaliação deprecia apenas a questão de interpretações bíblicas equivocadas por parte do autor e não a questão de avaliação médica. Ele é um especialista e não ousamos discutir área que não nossa competência . Ele mostra com propriedade as concepções erradas de muitos cristãos acerca da depressão, onde os quais atribuem tudo ao pecado, demônios ou punições de Deus. É preciso interpretar os fatos a partir de uma análise bíblica equilibrada e exegética, não desprezando os recursos médicos dados por Deus. Por isso a abordagem do Dr. Pérsio é importante e vem para somar no conhecimento do conselheiro cristão.
2.  A Doença Depressiva sob a ótica da Psiquiatria
            O autor expõe o aumento de depressivos no mundo, o que deve nos alertar. Sendo a doença do século. Em poucos anos será a principal doença no mundo. O que exige dos pastores uma condição cada vez maior de tratar esses problemas.
            O Dr. Pérsio demonstra com clareza que para a neurociências a depressão é uma desordem do funcionamento cerebral, que afeta e compromete o funcionamento normal do organismo, com reflexos ou consequências na vida pessoa em seus aspectos emocionas ou psicológicos, familiares e sociais. Ele ainda afirma: “A doença depressiva deve, portanto, ser examinada sob o ponto de vista biológico, genético, cognitivo, social, considerando ainda a história pessoal, econômica e espiritual.”[2]
            A pergunta que fazemos é se tal conceito que toda depressão é de fundo biológico, genético, cognitivo, social, não estaria o autor caindo no mesmo erro de Jay Adams que é denunciado anteriormente[3] como que atribuindo toda depressão a problemas pecaminosos? É necessário buscar o equilíbrio desta concepção entre os dois extremos.
            O Dr. Pérsio conclui seus argumentos neste capítulo afirmando que o tempo atual é conhecido como “década do cérebro”[4].
3. Angústia, Fé e Sentido da Vida na Pós-Modernidade
            O Drª. Dâmaris Cristina explica que a depressão pode ser um resultado desta interação do homem com o mundo, que muitas vezes lhe é inóspito. Pode ser a manifestação da escolha inautêntica do Ser.[5]        
Adiante a autora coloca que o homem se angustia com a possibilidade de ser ou não ser:
“O Homem vê-se mergulhado em angústia diante desta dimensão de Ser, frente à possibilidade de não Ser ou pelo temor ao seu Vir a Ser, por não conhecê-lo ou pela incerteza de não concretizá-lo. Sente-se incapaz de viver em liberdade de escolhas; teme escolher, principalmente optar por seu modo mais próprio de viver no mundo, de forma angustiada, mas preenchida de sentido e de incertezas.”[6]
            O homem só poderá contemplar sua existência mediada por relações a partir do outro e com os outros, explica a Drª Dâmaris.[7] Mas a sociedade com sua visão narcisista e materialista atrapalha esse processo de aprendizagem a partir do outro ou dos outros.
            4. A Depressão no Contexto da Psicologia de Carl Gustav Jung, da Religião e do Aconselhamento Pastoral Solidário
            O Dr. Máspoli vai introduzir seu assunto a partir de considerações sobre as várias visões religiosas de enfermidade, algo semelhante ao que fez o Dr. Pérsio. Ele aborda mais o aspecto da expiação como sendo um meio nas religiões antigas de expiar a culpa, tendo sempre Xamãs que detêm os poderes sobrenaturais para curar as enfermidades, o que precisamos em muitas igrejas evangélicas.
            Ele abordará a força da culpa nas culturas religiosas. A visão em muitos meios religiosos é que a causa das enfermidades é sempre a culpa. Essa visão causou uma grande quantidade de cerimônias de sacrifícios expiatórios.
            O autor denúncia a incompreensão de muitas igrejas evangélicas que têm no seu meio, pessoas histéricas, epiléticas e esquizofrênicas... que são tidas sempre como endemoniadas.[8] Essa prática visão ocorre muito no meio pentecostal e neo-pentecostal.
            É enfático a posição do Dr. Máspoli que as compreensões religiosas do passado e muitas do presente são equivocadas com relação as doenças da mente. Concordamos com ele, que o desenvolvimento, até mesmo científico, é recente e que por muito tempo houve uma ignorância tanto religiosa quanto cientifica. Mas o autor corre o risco de passar a ideia que no campo religioso existe uma plena ignorância de como lidar devidamente com o assunto. É lógico que no campo da medicina nem um pastor com formação teológica tem condições de avaliar corretamente questões biológicas, mas não teria como harmonizar as duas partes, médicos e pastores?
            O Dr. Máspoli é muito feliz na explicação com relação ao significado didático dos sacrifícios em Israel, como ordenanças de Jeová.[9] Mostrando que o ritual do sacrifício estimulava a pessoa a pensar sobre o sentido da falta cometida.
            Ele declara que: “Na medida em que o equilíbrio emocional se estabelece o equilíbrio espiritual se restabelece.” [10]Não seria o contrário? Qual tem primazia no nosso ser?
            Existe uma frase do Dr. Máspoli que é fantástica: “A Depressão é a imperfeição no amor.”[11] O deprimido sofre por falta de amor. Diríamos que por vezes se ama tanto que cai em depressão, sendo uma distorção do amor próprio, que busca a auto-destruição. Ele diz mais a frente: “O amor nos abandona de tempos em tempos e nós abandonamos o amor.”[12]
            O autor apresenta algumas características clássicas do depressivo, como: “...Ele (depressivo) e a cama são irmãos siameses...”[13];A depressão esparrama a concentração e fragiliza a vontade...”[14]; “A depressão geralmente leva a gula...”[15].
            Para concluir, são colocados alguns princípios fundamentais para a compreensão da depressão: a) As pessoas adoecem, sofrem e se deprimem por que são humanas;[16] b) A depressão deve ser compreendida numa perspectiva bíblica holística: Quando o homem adoece seu corpo, sua mente e seu espírito também sofrem;[17] c) Nada nos pode separar do amor de Deus[18]; d) A graça de Deus como base para a saúde humana e uma possível superação da depressão[19]; e)  O perdão incondicional de Deus como suporte para a mente do deprimido[20].
            Opinião:
            O livro tem relevância para todo conselheiro que deseja aprender mais sobre o mecanismo da mente humana. São especialistas na área medica com extrema experiência que lançam luzes para essa área tão carente de bons materiais.
            A leitura é agradável, com exceção de partes mais técnicas que para leigos em psiquiatria torna-se enfadonho, todavia, são poucas partes nesse caráter. Na maior parte do material é didático e exemplificado pelos autores.
            Todo cristão e especialmente os pastores devem ler esse livro. Ajudará bastante na compreensão de muitos aspectos relacionados as doenças da mente. Portanto, recomendamos para ser lido por cristãos com dificuldade de compreensão nesta área e para pastores conselheiros.
            Todavia, quando tocam em questões teológicas e bíblicas, cometem erros por não ser a área de atuação deles. Embora, o Dr. Maspoli seja pastor, sua atividade de maior dedicação é a psiquiatria e não a teologia. As recomendações são para as áreas de competências dos autores e não em outras tocadas pelos mesmos!
           
           Reverendo Márcio Willian Chaveiro





[1] DEUS, p. 30
[2] DEUS, P. R., p. 60
[3] DEUS, P. R., pp. 42-43
[4] p.88
[5] CRISTINA, p.97
[6] p.98
[7] p.102
[8] Máspoli, p.134
[9] pp. 140-150
[10] p.148
[11] p.156
[12] p. 158
[13] P.160
[14] P.160
[15] P.160
[16] P. 214
[17] P.217
[18] P.219
[19] P.223
[20] P. 224